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Publicado em: 28/11/2025 - 12h52 Atualizado em: 28/11/2025 - 12h54 Tags: Reintegração social, Ressocialização, Presídio

Esperança em traços e cores: o Judiciário e a reintegração social na Paraíba

Na fotografia temos um homem negro, usando óculos, pintando uma paisagem em uma tela
José Francisco dos Montes pinta enquanto espera a liberdade

As mãos firmes que colorem o tecido esticado sobre um chassi de madeira são comandadas por uma mente que, por hora, alimenta no coração um único desejo: voltar a ser livre e ter a oportunidade de recomeçar, conviver novamente no meio social assegurando a todos que cruzarem seu caminho de que está pronto para viver, na prática, a ressocialização.

A pintura em tela é a esperança do reeducando José Francisco dos Montes. Ele aposta na arte para viver com dignidade quando não estiver mais privado de liberdade. O que deve acontecer daqui a dois anos, data prevista para que José Francisco deixe a Penitenciária Desembargador Silvio Porto, em João Pessoa.

“Uma das coisas importantes na qual essa oportunidade que a ressocialização me deu foi eu pintar meus quadros. Eu pinto quadros para que outras pessoas vejam e despertem a arte dentro delas. Dia desses uma pessoa veio e perguntou: eu posso pintar também? Eu respondi: pinte porque eu posso te ajudar. Quando eu sair daqui quero ter um espaço onde eu possa ajudar as pessoas a viverem dessa arte”, contou José Francisco.

Para ele, pintar é como viajar na imaginação e poder experimentar a magia do bom e do belo inserido na sociedade. “Eu pinto lugares que eu gostaria de estar. Nessa selva de pedra onde vivemos não tem alma, não tem vida. Aí você vai na floresta, você fecha os olhos, ouve o canto dos pássaros, o vento passando através de você. Isto é que é a arte”, colocou José Francisco.
 

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Em resumo, ressocializar significa ajudar alguém a readquirir valores, habilidades e comportamentos necessários para viver em harmonia dentro da sociedade.

Uma palavra com um significado potente e muito bem compreendido pelo Poder Judiciário paraibano. Coordenadora do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e Socioeducativo (GMF-PB), do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), a juíza Aparecida Gadelha desvenda para nós um conceito ainda mais aprofundado do termo ressocializar.

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E, para que a essência da palavra seja retirada da letra e colocada na prática, a estrutura organizacional que possibilita a ressocialização precisa funcionar como engrenagens de uma máquina que não pode parar. Por isso, são muitos os atores sociais que se dão as mãos para imprimir movimento a esse conceito.  

Na fotografia temos a juiza Aparecida Gadelha acompanhada por um homem e uma mulher no Presídio Silvio Porto
Juíza Aparecida Gadelha durante visita ao Presídio Silvio Porto

“Nós podemos até dizer que a ressocialização é um conceito muito mais amplo do que nós costumamos pensar. É preciso oferecer estudo, capacitação profissional, toda essa estrutura de serviços realmente é fornecida pelo Poder Executivo, através da Secretaria de Administração Penitenciária. O Poder Judiciário também tem uma participação muito importante através dos juízes e juízas da Execução Penal no sentido de orientar esses serviços, fiscalizar, trazer a sua visão do aproveitamento desses serviços. Não é somente oferecer o serviço, é ler também o cidadão ou a cidadã que está fazendo o uso desse serviço. É ler sua estrutura familiar, ler suas possibilidades para além do cárcere”, completou a juíza Aparecida Gadelha.

Ressocialização impulsiona vocações 

E nessa perspectiva que nos traz o significado da palavra ressocializar, as habilidades individuais são objeto de observação para fazer nutrir as vocações de reeducandos no Estado da Paraíba, com o aval e o apoio do Poder Judiciário. As aptidões de cada um são ferramentas que validarão a volta deles ao convívio social. 

É com esse olhar atento e cuidadoso que os integrantes da direção do Presídio Silvio Porto buscam ativar os conhecimentos inatos nos reeducandos e ressocializá-los. Um desses olhos observadores e incentivadores é o do Sérgio Souza, diretor adjunto do Silvio Porto.

Na fotografia temos Sérgio Souza, diretor adjunto do Silvio Porto dando entrevista. ele veste uma camisa preta, usa óculos e tem barba
Sérgio Souza, diretor adjunto do Silvio Porto

“Nós temos mais de dois mil apenados aqui, e muitos são trabalhadores. A gente descobre os talentos deles, as habilidades técnicas que eles têm e vai aproveitando, dando oportunidade para que eles desenvolvam suas habilidades, seus talentos aqui. São mais de 100 apenados trabalhando e diversos talentos para a arte. É o caso das pinturas, esculturas, por exemplo”, coloca Sérgio Souza. 

Uma oportunidade para que quando o reeducando deixe o sistema prisional, ele possa alcançar os melhores objetivos. E tudo isso refletirá na sociedade como um todo. “É uma quebra de paradigmas, na verdade. Quem não conhece, quem nunca veio aqui, não entende. Não imagina como é aqui dentro, não imagina esse lado positivo que tem. Esses projetos sociais são justamente para mostrar que é possível desenvolver algo positivo aqui dentro e quebrar paradigmas lá fora”, aposta o diretor adjunto do Silvio Porto.

A arte da jardinagem - Por trás do portão de ferro que descortina um ambiente sisudo, as cores de um belo jardim evidenciam um grande talento. Dessa vez, são as mãos do reeducando Edenilson Tavares que trabalham para tornar a construção com paredes de concreto e grades de ferro um local mais agradável para se viver. Ele também está entre os reeducandos que tiveram suas vocações impulsionadas.

Na fotografia temos um reeducando de blusa clara, calça jeans e chapeu amarelo trabalhando no jardim do presídio
Reeducando Edenilson Tavares trabalha com jardinagem

“Apesar de estar preso, me sinto feliz e estou deixando um legado, porque estou ensinando a muitas pessoas aqui a trabalhar com arte. Os que vejo que têm o dom e desenvolvem esse dom. Alguns até já saíram e estão trabalhando com essa arte. Quando eu estiver em liberdade, quem quiser aprender, eu estarei pronto para ensinar com maior prazer. Vou sair daqui com muitos aprendizados novos. Apesar de estar preso, transmito alegria para meus familiares quando eles vêm me visitar, através do meu trabalho com a jardinagem”. 

Edenilson confessa que, para ele, a oportunidade do trabalho já trouxe liberdade, tornou sua mente livre. “Meu sentimento na arte é de liberdade. Optei pela arte porque me deixa livre mentalmente, mais jovem, como uma cascata, uma fonte, me sinto livre, todas as minhas artes eu crio e quando estou criando vejo que vivo mais, a arte me transmite amor, e quando me sinto com amor ao próximo me sinto com mais energia e vigor”, colocou.

Ressocialização na Paraíba. O Estado da Paraíba tem uma política pública instituída por lei e diversos outros marcos que fomentam a reintegração social dentro do sistema prisional estadual, tanto no regime fechado, como também a política do egresso através dos escritórios sociais, que são uma parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e com o Judiciário Paraibano. São mais de 70 projetos espalhados nas detenções, oportunizando recomeço para homens e mulheres privados de liberdade.

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“Nós temos um programa específico voltado ao artesanato, a produção de arte, que é o caso da exposição de telas e é verdadeiramente uma profissão que essas pessoas aprendem e muitas já têm esse dom e são potencializadas e desenvolvidas dentro do sistema penitenciário. Trazer para a sede do Poder Judiciário essa exposição, foi materializar esses sonhos, esse trabalho que acontece nas unidades, sobretudo de esperança para essas pessoas, de seguirem o novo recomeço, de terem a partir do desenvolvimento dessas habilidades, uma forma, um meio de subsistência para eles e para suas famílias”, completou João Rosas.

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O gerente de Ressocialização do Sistema Penitenciário paraibano explicou que desde o ingresso na unidade prisional é feita uma individualização da pena, a partir de uma comissão técnica instituída no estado, onde é traçado um planejamento para as pessoas, identificando desde a questão educacional, social, familiar e empresarial - este último setor é o que oportunizará o retorno ao trabalho formal.

Afinal de contas, quando reeducandos e reeducandas voltarem a conviver em sociedade, precisam de olhos sociais que os enxerguem sem a trave do preconceito. “É um trabalho que a gente faz desde a educação básica, passando pela profissionalização, inserção nas atividades produtivas, mas também trazendo a sociedade, a classe empresarial para esse contexto, quebrando estigmas que a gente sabe que ainda são muito fortes em nosso país”, concluiu João Rosas.

Por Nice Almeida 

Fotos: Ednaldo Araújo

Artes: Jandi Soares

 

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