Ato de arbítrio nos primórdios do tjpb
Dissolução Violenta do Superior Tribunal de Justiça do Estado do Parahyba do Norte
O primeiro governador republicano da Paraíba, o Juiz Municipal (imperial), Juiz de Direito e Juiz Federal Venâncio Neiva, em 1924, aos 75 anos de idade, é visto aqui, de terno branco e cercado por familiares, num detalhe de foto da Coleção Humberto Carneiro da Cunha Nóbrega, hoje na Biblioteca do UNIPÊ (Centro Universitário de João Pessoa). Venâncio foi deposto entre fins de 1891 e inícios de 1892, mas voltaria à Política em 1918, elegendo-se e reelegendo-se Senador da República. Foi ele quem instalou oficialmente o Superior Tribunal de Justiça do Estado do Parahyba do Norte, sendo derrubado do Governo cerca de três meses depois. Insatisfeito, somente voltaria à Política em 1918.
Esta é uma foto rara. O original está na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Uma cópia foi divulgada no sexto volume da História do Brasilde Pedro Calmon. O personagem retratado é o general Savaget — o mesmo homem que, entre fins de 1891 e inícios de 1892, ainda no posto de coronel, servindo na Paraíba, depôs o governador paraibano Venâncio Neiva. Cumpria ordens do Governo do marechal Floriano Peixoto.
Atribuiu-se ao coronel Savaget o desejo de tomar o Poder estadual para si, como um homem sequioso por ingressar na Política, num tempo em que tanto militares quanto magistrados podiam atuar abertamente como políticos. Nada mais inexato, porém. Como se disse, ele, como militar disciplinado e republicano de quatro costados, apenas cumpria ordens de seus superiores no Exército. Ordens que lhe chegavam pelo telégrafo, por telegramas e por outros precários meios. E as ordens eram neste sentido: depor o Governador, evitar que aproveitadores (inclusive antigos monarquistas) assumissem o Poder e guardar o lugar de governante até que chegasse o novo escolhido do regime, outro militar, Álvaro Lopes Machado.
O então coronel e depois general Cláudio do Amaral Savaget (ou de Amaral Savaget) mais adiante se tornaria muito conhecido, como um dos cinco generais que comandaram o quarto exército enviado ao interior baiano para combater os homens do beato Antônio Conselheiro, em Canudos.
É, portanto, personagem muito citado em todas as obras que tratam de Canudos, em especial no clássico Os Sertões, de Euclides da Cunha, e no romance de Mario Vargas Llosa, La guerra del fin del mundo.
Neste mesmo Memorial (ver o item Personagens: Cláudio do Amaral Savaget), o internauta encontrará praticamente tudo sobre o este militar que, como coronel, depôs o governador paraibano Venâncio Neiva e dissolveu o recém-instalado Superior Tribunal de Justiça da Paraíba.
Ascensão e queda de Venâncio Neiva, com a consequente dissolução do Tribunal
O dia 15 de novembro de 1889, data da proclamação da República dos Estados Unidos do Brasil, com a consequente queda do Império e da Monarquia, foi determinante para que assumisse o Governo da Paraíba um magistrado oriundo do regime monárquico, mas que logo convocaria uma Constituinte e ainda logo depois instalaria oficialmente o primeiro Tribunal de Justiça da antiga Província. Era ele o Juiz de Direito Venâncio Neiva [ver, neste Memorial Virtual, o item Personagens: Venâncio Neiva], então servindo na Comarca de Catolé do Rocha, Sertões paraibanos. Ele havia sido nomeado Juiz por interveniência do futuro Barão do Abiaí, monarquista convicto.
Já a data de 23 de novembro de 1891, que marca a renúncia do generalíssimo Deodoro da Fonseca ao Governo provisório e sua substituição pelo marechal Floriano Peixoto, selou o destino desse mesmo governante local, o Dr. Venâncio Neiva. Em consequência da mudança de regime em âmbito nacional, ele foi localmente apeado do Poder, em inícios de 1892, e por algum tempo jogado ao ostracismo político.
Desembargador também perde cargo de Vice-Governador — Ocorre que o então primeiro-vice-presidente do recém-constituído Estado do Parahyba do Norte, o desembargador Manoel da Fonseca Xavier de Andrade, era igualmente presidente da mesma Corte de Justiça criada e instalada por Venâncio Neiva.
Com a queda de Venâncio, ele tratou de assumir o Governo estadual, como seu substituto legal e disposto a não cedê-lo a uma tróica governativa presidida por um militar florianista. Mas da mesma forma viu-se derrubado do cargo, como já o fora das funções de presidente do Tribunal dissolvido.
O primeiro desembargador-presidente do Superior Tribunal de Justiça do Estado do Paraíba do Norte, Xavier de Andrade, tinha sido nomeado para compor a lista dos primeiros cinco desembargadores da Corte de Justiça quando era Juiz de Direito em Santa Rita. Tinha sido também deputado constituinte estadual. E esse magistrado, mui desgostoso com tantos atos de violência (a destituição do Governador, do Vice-Governador, dos recém-nomeados desembargadores e dos parlamentares constituintes, entre outras arbitrariedades partidas de um regime republicano acabado de se inaugurar justamente com base na luta contra a tirania), retirou-se para suas atividades políticas como parlamentar e, também, para sua antiga judicatura no município santarritense.
Mas ficou realmente muito desgostoso com a Política, com a vida pública, com as atitudes dos novos donos do Poder — e não quis saber de retornar ao Tribunal, mesmo depois da restauração deste.
Em Comparação com Outros Estados — Não obstante esses atos atrabiliários, é incrível constatar como se fez razoavelmente pacífica na Paraíba a transição da Monarquia para a República, e como também seria menos violenta, em comparação com outras partes do país, a transição dos desmandos do período de Deodoro da Fonseca para os desmandos do consulado Floriano Peixoto, entre trancos e barrancos (sobretudo trancos) o verdadeiro consolidador da República.
Aqui, como no informativo Judiciarius, o leitor terá oportunidade de acompanhar de perto a História dos primórdios do Tribunal de Justiça da Paraíba — uma História de conquistas, sim, mas também de vicissitudes, momentos de extrema tensão e acontecimentos por vezes inacreditáveis para os padrões modernos do Poder Judiciário.
Presença da Paraíba no Plano Federal — Embora o movimento republicano não se apresentasse forte, na Paraíba de então (não obstante o grande número de talentosos e idealistas paraibanos que, aqui, em Recife e no Rio de Janeiro, lutavam, em plena Monarquia, pelo advento da República), é impressionante constatar a marcante presença de representantes de nossa antiga Província junto aos Poderes emergentes do novel Governo republicano em nível nacional.
Essas figuras, amigas de Deodoro e/ou de Floriano, tiveram superior influência nos acontecimentos que determinariam a posse (e também a derrubada) do governador Venâncio Neiva, assim como na ascensão do sucessor dele, o major-instrutor de engenheiros Álvaro Lopes Machado — segundo Governador republicano da Paraíba e responsável pela restauração do dissolvido Tribunal.